Fechei os olhos para não ver o
tamanho da queda, embora ela fosse mais que inevitável. Senti perder o equilíbrio, perder o controle
dos movimentos, fechei os olhos para tentar mascarar a dor que vinha e BAM! Assisti tudo em slowmotion e por isso tenho detalhes para contar por mais de uma hora de um evento que durou pouco mais de um segundo.
Outro dia vi um filme em que a personagem dizia ter substituído todas as suas drogas por adrenalina quando perguntaram a razão dela ficar o dia inteiro sentada no parapeito de um prédio. E isso meio que me conectou a ela, àquele instante, pois às vezes parece que a gente sempre procura um precipício novo para encarar, todos os dias, em troca de algum sentimento, emoção, ilusão...
Outro dia vi um filme em que a personagem dizia ter substituído todas as suas drogas por adrenalina quando perguntaram a razão dela ficar o dia inteiro sentada no parapeito de um prédio. E isso meio que me conectou a ela, àquele instante, pois às vezes parece que a gente sempre procura um precipício novo para encarar, todos os dias, em troca de algum sentimento, emoção, ilusão...
Não sou uma pessoa de muita
sorte e talvez por isso - ou por ser desengonçado mesmo - me quebrei. Tinha cruzado os
dedos para continuar vivo, já que cruzar os pés um no outro e cair, torcendo o tornozelo, não foi das manobras mais bem executadas. Mas também, todo skate devia ter manual de
instrução do tipo: produto proibido para seres humanos, ou então, designado
para fazer com que você dependa dos outros, substância impregnada de adrenalina e de atestados médicos... De qualquer maneira, tive que abrir os olhos depois da queda. E ali estávamos: eu, o chão, o skate virado com as rodas ainda girando do meu lado,
algumas pessoas rindo ao fundo e o céu estrelado... Cara, e que céu! Juro que a
parte boa desse slow motion natural é lembrar daquela noite estrelada. Parecia
uma cortina de miçangas, sabe? Meio psicodélico, meio bonito demais para ser
verdade. Nem a dor nem os analgésicos diminuiriam sua beleza.
Um amigo meu costumava falar que sua
vida é uma eterna batalha para saber quem o mata primeiro: hipertensão, porque
come tudo com muito sal, ou diabetes, porque o doce é algo que não tem limites.
Eu não estou muito longe disso aí não: minhas expectativas para a vida são
muito altas para me privar de alguma possibilidade. Já um outro amigo me dizia
durante um trekking que, se dependesse dele, o Brasil era só um bando de
pessoas morando ali nas redondezas de Porto Seguro, porque "diabo é quem tem
coragem de dar a vida para desbravar uma terra cheia de bicho e mato". Quer
dizer, bicho que pode te matar, mato que pode te matar.
Bom, concordo e discordo de ambos. Mais do que viver muito, quero viver intensamente. E isso aparentemente implica em diversificar as minhas opções de causa mortis, seja andando de skate,
fazendo trilha no meio de bichos e matos, salto no canto mais fundo da cachoeira e do cais, viajando
nesses aviões que cada vez caem mais, nesses ônibus que desafiam precipícios, nessas comidas salgadas ou nos outros muitos destrutivos vícios. Se você olhar bem, a todos os riscos do mundo podemos estar sujeitos, desde uma guerra no Paquistão ou um terremoto no Japão, uma nova doença ou uma velha vontade de se sentar no parapeito de um prédio.
É meio paradoxal e contraditório, mas não tenho medo
da morte. Na verdade, são muitas as opções que eu dou além da hipertensão e da
diabetes para que ela venha e me leve logo. Eu tenho medo mesmo é da
possibilidade de me faltar a coragem para cair, de perder a vontade de me arriscar a cruzar os pés um no outro e sair bolando por aí, incerto das consequências. Não sei o que faria sem esses slow motions para apreciar
a beleza estática e luminosa do céu estrelado, pois no fundo sou apenas um punhado da mais insignificante poeira do universo. Aquela poeira da qual todos somos feitos.