Não sei viver sem gravidade. Na verdade, nunca aprendi a
flutuar, a boiar ou a me abster dos meus próprios pesos e pesares. E da mesma
forma que a palavra sugere, a gravidade lembra a severidade que as coisas têm
sobre as outras: tudo é grave, tudo te traz pro chão ou então te afunda pro
abismo onde a falta é uma constante. Falta de chão, falta de pão, falta de ar,
falta de luz, falta de vontade. Não é fácil admitir mas a falta é uma grandeza
como a própria gravidade, cresce exponencialmente e se choca contra o chão com
toda força se espatifando em não-desejo.
E eu, aqui enquanto caio, percebo que o abismo mais parece um
espelho, pois enquanto nele me jogo ele também vem se jogando em mim. E nesse encontro a
meio caminho, nessa queda em que estou, nesse mergulho no rio de cores
vibrantes e ondas assassinas, é o precipício que aí vem; eu o vejo chegando pouco a
pouco. O choque é iminente, inevitável, é grave.
Eu quero muito acreditar que o meu abismo é o meu desejo já
devaneado, estimulado por impulsos de luz, som, fumaça e embriaguez; mas não,
aquele que vem, aquele que eu vejo, é uma criança corroída pela medusa
carnívora. Todo gris, roto, colado em pedaços; esquecido, desenganado, morto.
Assim como o não-desejo, que também não tem cura.
Ninguém é obrigado a ser o chão duro da minha queda, mas
todos estão condenados a viver sobre e sob a mesma gravidade.
2 comentários:
Owo amore mio. No momento, estou me sentindo dessa forma. Vc advinha sempre né?
Lindo texto.bj
Kokinha
Lindíssimo!! bjus
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