Hoje faltou água. Não faltou água no planeta, nem na
torneira, também tenho algum dinheiro guardado para comprar e, porra, é basicamente
só ligar que alguém viria entregar a droga da água. Mas não. Mesmo assim, hoje
faltou água.
Veja bem, a questão na verdade não tem nada a ver com a sede.
Tem a ver com a maneira com que as coisas se repetem na vida. Tem a ver com a
programação que essa mente faz para que os efeitos meramente secundários de um
ato preguiçoso sejam prazerosos e viciantes, ainda que o resultado principal seja frio e doloroso. É muita autossabotagem numa pessoa só.
Na verdade minha queixa é contra a organização que a vida requer:
amor, trabalho, estudo, sono, comida, água, sexo, tempo, sempre o tempo. O tudo versus o nada justamente quando meu nome é ninguém e meu sobrenome é o zero.
Está tudo ao avesso, revirado. Não que eu ache que exista uma fórmula correta
para qualquer coisa, mas pelo menos acho que não precisava ser um quebra-cabeça
de infinitas peças. Quebrem minha cabeça, por favor!
Todo sentimento é uma bagunça e eles se parecem tanto,
meu deus, com a pilha de cuecas sujas escondida dentro do guarda-roupa, e se
parecem tanto com os trabalhos não terminados, e se parecem tanto com a
incapacidade de se concentrar e se parecem tanto com a festa de ilusões
desfeitas do coração... E com os atrasos, e com as dívidas, e com as angústias.
É tudo tão confuso e tão soberbamente programado que eu só posso pensar que a
vida tem um esquema do qual eu já devia ter sido excluído por absoluta
incompetência.
É muita coisa para resolver, muito trabalho a fazer, sintoma
a desvendar e porta aberta para fechar. Enquanto isso, enquanto não fazemos
nada para mudar, vou aqui tratando meus sintomas um por um; a mente lotada de
problemas e a geladeira vazia, afinal hoje faltou água.
Nenhum comentário:
Postar um comentário