domingo, 30 de outubro de 2022

Eu, quem?

Venho tentando ser eu há muito tempo, mas às vezes desisto. É muito difícil encontrar uma razão que justifique o esforço que é se mostrar uma pessoa só, sempre e sempre. Além disso, cadê o meu eu que gostava de fingir ser professor, que brincava o tempo inteiro e adorava olhar para as estrelas, que dançava sem vergonha? Cadê minha criança?

Não acho que seja privilégio meu sofrer sozinho na busca de escolhas justas para mim e para o mundo, livre de interferências e sólida face às incertezas da vida. Justas em parte, porque eu sou fraco, egoísta e minto. Não sei o que fazer com o amor que depositam em mim e tenho dificuldades em retribuir e ser recíproco. Admitir isso me deixa mais próximo do que eu quero ser, claro, mas não diminui aquele esforço. E esse movimento de Sísifo, eternamente subindo pedra morro acima e vê-la rolar desabalada morro abaixo, todo santo dia, só traz angústia.

Tenho inveja de quem crê em deuses ou astros, signos ou mãos, queria ter essas cartilhas ou muletas para ser menos triste. Abraçar a simplicidade, a idade, a cidade, a felicidade, que para Nietzsche é a ignorância. E eu concordo com ele por um lado: quanto menos você se importa com os problemas, menos eles te incomodam. A questão é que muita gente toma o caminho oposto, tem na ignorância a chave para a maldade (consigo e com os outros) e não para a felicidade. Afinal, não é preciso ser triste para ser consciente, dá para ser triste e ser um filho da puta também.

Nessa luta para descobrir quem sou, preciso me ouvir mais e resgatar minha criança. Quebrar a casca grossa do adulto e deixar sair o que me aprisiona e entrar o que me liberta. Eu vou iniciar esse processo e desistir várias vezes, mas não vou deixar de fazer, prometo. Esse caos aqui dentro, essa confusão, vai sempre existir, eu só preciso respirar e olhar para estrelas e dançar que vai dar certo.